quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Enfim, CAU é sancionado!

Presidente Lula sanciona lei que cria o Conselho de Arquitetura e Urbanismo
Brasilia-DF, 17:45h, do dia 30/12/10.


O Presidente Lula acaba de sancionar a Lei que cria o Conselho de Arquitetura e Urbanismo no Brasil, nos Estados e no Distrito Federal na presença das entidades nacionais dos arquitetos e urbanistas.
Uma grande vitória de uma luta que se iniciou há mais de cinquenta anos.
A Lei será pulicada amanhã, 31/12/2010, no Diário Oficial da União.
Aguarde maiores informações no Boletim Especial do SARJ.

Do Palácio do Planalto
Jeferson Salazar
Presidente do SARJ

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Novos ares na política paraibana

As surpresas de 2010
Reginaldo Marinho


Mais um ano chega ao fim. É nessa época que fazemos balanços parciais de nossa existência e, contaminados pelo espírito do Natal, nos tornamos mais solidários. As reflexões são naturais no período natelino. A contabilidade dos erros e acertos permite a evolução espiritual de cada um de nós. Confesso que tenho errado menos, mesmo sem querer ser tão certinho.

É bem melhor quando conseguimos transcender esse balanço individual e compreender contabilidades de maiores dimensões. As empresas, as sociedades, as cidades, os países e até o planeta tem a sua contabilidade. A prova disso é conscientização acelerada, no planeta inteiro, dos fenômenos que causam as mudanças climáticas. As contas estão desfavoráveis ao equilíbrio do planeta.

As mudanças climáticas exigem que cada cidadão do mundo assuma a sua parcela de responsabilidade para frear a degradação ambiental.

Voltemos às reflexões paraibanas. No âmbito da política, tivemos duas gratas surpresas. Uma delas foi a brilhante atuação do senador Roberto Cavalcanti no Senado Federal. No período de dois anos, ele fez 93 pronunciamentos na tribuna do Senado. Foi o relator de 186 matérias versando sobre temas variados e apresentou 22 projetos de lei.

Esses números já seriam suficientes para colocar o senador noviço em evidência aqui e alhures. Quando o Superior Tribunal Federal, por um ato imprudente de seu ex-presidente Gilmar Mendes, desregulamentou a profissão do Jornalismo, o senador Roberto Cavalcanti foi um dos primeiros políticos paraibanos a assinar a PEC 33/2009, conhecida por PEC do diploma. Sendo o dono do poderoso Sistema Correio de Comunicação, o senador ficou do lado de seus operários da comunicação e honrou a categoria dos jornalistas.

O senador não parou de surpreender. Ele empenhou-se em enfrentar um perigoso tentáculo do sistema financeiro nacional, o dos cartões de crédito. Um instrumento lesivo à economia popular que opera às margens do sistema financeiro, sem regulamentação alguma.

A outra surpresa ficou por conta do arquiteto e urbanista Luciano Agra. Luciano foi escolhido pelo ex-prefeito Ricardo Coutinho para mexer com a fisionomia da capital paraibana. Como secretário de Planejamento do Município e, depois vice-prefeito, ele promoveu algumas ações que impregnaram o mandato municipal de conceitos urbanísticos até então desprezados por prefeitos anteriores. A eleição de Ricardo Coutinho para governador do Estado promoveu Luciano Agra ao cargo de prefeito da Capital.

Professor de Arquitetura da UFPB, Luciano decidiu executar na Prefeitura o que ensinava aos seus alunos, muitos deles já exercendo a profissão de arquiteto, e transformou a cidade em um laboratório bem sucedido de obras que fortalecem a estima do técnico, do gestor e da população.

Amparado pelo Ministério Público, Luciano mudou a paisagem de Tambaú. Retirou as barracas que impediam a visualização do mar e ficamos um pouco mais civilizados. Os seus atos são lições fundamentadas de uma boa escola de Arquitetura e Urbanismo. Cada paraibano tem na gestão de Luciano Agra um curso cotidiano, intensivo e gratuito de Urbanismo. É uma experiência singular e gratificante.

O gesto definitivo de coragem, ousadia e de cidadania do prefeito Luciano Agra foi a desapropriação do Aeroclube da Paraíba para a criação do Parque Parahyba. São quase 70 hectares de área nobre encravada num dos mais valorizados bairros de João Pessoa. Essa era uma atitude de governo que a sociedade paraibana silenciosamente aguardava e, agora, aplaude.

Temos o privilégio de protagonizar um fenômeno urbanístico que foi apenas precedido por Curitiba, na gestão do arquiteto e urbanista Jaime Lerner.


RM@reginaldomarinho.com.br

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Opinião

CARLOS ARANHA
Publicado no "Correio da Paraíba"

O PREFEITO E O PARQUE PARAHYBA

Nestes meus já consideráveis anos de João Pessoa, há tempo que não via um ato administrativo tão rápido, corajoso e benéfico à população como esse do prefeito Luciano Agra, que assinou na semana passada o decreto de desapropriação do Aeroclube da Paraíba. Não apenas para evitar o risco de uma tragédia - que quase acontecia há poucos dias -, mas para criar o Parque Parahyba, com 66,15 hectares, aumentando em não sei quantos e necessários “dígitos” as condições de lazer seguro para uma população dele ainda tão carente.

Lembro agora de um artigo escrito por meu saudoso irmão, Marcus Aranha, publicado neste jornal no dia 3 de outubro, intitulado “O aeroclube”, em que ele, um apaixonado pela cidade, afirmou: “João Pessoa está precisando de um novo parque. Era bom que o aeroclube se fosse de mudança e os hectares dele fossem transformados num parque como o ‘Parque da Cidade’ em Brasília: gramado e árvores! No meio delas, quadras de esportes, área para piquenique, ciclovia, lugar para armar redes, trilha para caminhadas, área para realização de shows, um teatro de arena, um pavilhão para exposições”... Meu irmão, um senhor cidadão, escritor e médico, foi achincalhado num “direito de resposta” assinado por um dos membros do Aeroclube da Paraíba. Agora, nos “campos verdejantes” onde deve estar, seu espírito deve estar alegre e reconhecido com a atitude que é comum a grandes administradores: a desapropriação assinada por Luciano Agra.

Em seu artigo, Marcus Aranha advertia que “esse negócio de avião subindo e descendo entre os prédios do Bessa pode terminar em tragédia. Imagine um teco-teco daqueles entrando pelas vidraças de um apartamento”... Sete dias depois, o incidente com um monomotor nas imediações do Aeroclube “expôs a fragilidade da sua localização na malha urbana e reacendeu o debate sobre a segurança das edificações e dos moradores do seu entorno”, como lembrou ontem o arquieto Oliveira Júnior. Seis dias a seguir, o prefeito anunciou a desapropriação.

A diretoria do Aeroclube tem direito agora ao “jus sperneandi”, mas, com certeza, prevalecerão junto à Justiça os anseios da população e a firme e correta decisão do prefeito de João Pessoa.
 
Fonte: Twitzer

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Democratizando as oportunidades

A desapropriação do Aeroclube da Paraíba
Concurso de projeto para o Parque Urbano Linear da Parahyba!

O incidente com um monomotor ocorrido no dia 10 deste mês nas imediações do Aeroclube expôs a fragilidade da sua localização na malha urbana e reacendeu o debate sobre a segurança das edificações e dos moradores do seu entorno.

Na última quinta-feira (16) o prefeito de João Pessoa, Luciano Agra, anunciou, um dos seus mais audaciosos atos desde que assumiu o comando da administração municipal: o decreto de desapropriação do Aeroclube da Paraíba. A área desapropriada cederá espaço para a criação de um Parque Linear Urbano que incorporará também as áreas adjacentes das margens dos canais existentes nas cercanias. Embora o Parque já estivesse previsto desde a revisão do Plano Diretor Municipal em 2008, a lei 11.854 que o criou só foi sancionada no início deste ano.

Com uma postura firme, Agra defendeu o interesse público do projeto e garantiu que se o processo não ocorrer de forma consensual não hesitará em utilizar todos os meios legais para efetivá-lo. “A decisão não representa nenhuma hostilidade. Queremos conversar (com a diretoria do Aeroclube da Paraíba) e esperamos um acordo amigável e consensual”, enfatizou.

Segundo informações do portal da PMJP a área do Parque Linear Urbano Parahyba será de 66,15 hectares e contará com infraestrutura, equipamentos e mobiliário urbano voltados para o lazer ativo e passivo como áreas de convívio, ciclovias e jardins. O esboço do projeto elaborado pela equipe multidisciplinar da PMJP apresenta recomendações para o uso e ocupação do solo, para o paisagismo, a drenagem do solo e para a amenização dos impactos ambientais.

Vista aérea do Aeroclube da Paraíba -  Autor desconhecido

A notícia da desapropriação do Aeroclube e a possibilidade de criação de um Parque Urbano naquele local foi um dos assuntos mais comentados na cidade e principalmente entre as redes sociais. No Twitter, arquitetos e estudantes foram unânimes quanto à realização de um consurso público de projeto para o Parque Urbano Linear Parahyba. O ex-governador Cássio Cunha Lima indagado sobre a possibilidade do concurso para o parque não exitou em apoiar a inciativa. A ex-candidata à Câmara Federal, arquiteta Rossana Honorato acredita que o prefeito Luciano Agra será favorável ao pleito dos arquitetos e remeteu ao Instituto de Arquitetos do Brasil, Departamento da Paraíba (IAB-PB) a responsabilidade em provocar o debate e reinvidicar a realização de um concurso para escolher a melhor proposta para o Parque Parahyba.







Como professor universitário e arquiteto com quase 20 anos de atuação no mercado defendo o concurso de projeto como uma das ferramentas mais democráticas e eficientes para escolha de propostas de intervenção em áreas de grande interesse público. Este tipo de iniciativa provoca os profissionais a aprofundarem seus conhecimentos e a buscar as melhores soluções para os "problemas" arquitetônicos e urbanísticos da cidade. Não obstante se tratar de uma excelente oportunidade para os jovens profissionais mostrarem seus talentos e competências, se inserirem no mercado e projetarem suas carreiras.

Acredito que este seja um momento especial na carreira política de Luciano Agra e que o mesmo terá a sabedoria de atender aos anseios mais legítimos da população pessoense apoiado numa vasta possibilidade de opções de desenho urbano legitimadas por meio de um concurso de projetos sério e remunerado pela tabela de honorários do IAB Nacional.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O mercado como intermediário entre a arquitetura e a cidade

O futuro é o mercado
Valentina Figuerola



Com uma personalidade expansiva e questionadora, Massimiliano Fuksas acredita que o campo de atividade dos arquitetos não deve se limitar à estética. Para ele, além de criar edifícios funcionais e integrados à paisagem urbana, o arquiteto deve "ajudar os outros (leigos) a compreender o que é a boa arquitetura". Foi com essa visão que o romano, descendente de lituanos, definiu o tema da Bienal de Veneza de 2000, o polêmico Less Aesthetics, More Ethics, ou Menos Estética, Mais Ética, em português. Como curador-geral da mostra, Fuksas lançou o debate sobre o novo contexto social e urbano e o compromisso dos arquitetos como intelectuais. Formado em 1969 pela Faculdade de Arquitetura La Sapienza, da Universidade de Roma, ele trabalhou com o historiador e crítico de arquitetura contemporâneo Bruno Zevi e, aos 16 anos de idade, foi discípulo do pintor surrealista De Chirico. Dentre os principais trabalhos do italiano estão o edifício da entrada da Caverna de Niaux e a Casa das Artes, ambos na França, a Municipalidade do Cassino, na Itália, o Centro da Paz, em Israel e o plano urbanístico da Praça das Nações Unidas, em Genebra. Em entrevista à AU, Massimiliano Fuksas fala sobre megalópoles, sua relação com o mercado imobiliário e a arquitetura brasileira.


aU Como você resolve a equação que envolve o dever do arquiteto e sua relação com o mercado imobiliário?

FUKSAS Eu acabo de descobrir o que é o mercado imobiliário e no início fiquei bastante assustado, porque estava acostumado com o cliente público. Não existem mais obras públicas, o governo deixou de ser cliente, não investe mais. Pelo que sei, o mesmo acontece no Brasil. Há hoje um novo tipo de cliente que é privado, porque utiliza o capital da iniciativa privada, mas não deixa de ser público, visto que não constrói para uso próprio, mas para outros ocuparem. Para esse cliente, obra é investimento. É uma situação completamente nova que exige do arquiteto uma nova forma de pensar. Você projeta para você mesmo, ou para um público que você tem de tentar imaginar quem é. Isso é muito estranho.

aU Além disso, ao trabalhar para o mercado imobiliário, o arquiteto assume o compromisso de trazer lucro para o investidor, não é? Imagino que ao desenhar o Vienna Twin Towers você tenha enfrentado essa situação...

FUKSAS Na verdade não. Esse projeto ficou em um meio termo nesse sentido. Foi o último empreendimento feito para um cliente. Depois disso surgiu algo novo, o incorporador.



aU Como você lida com o incorporador? Como conciliar a obrigação de promover lucro com a produção de uma arquitetura de qualidade?

FUKSAS Bem, tentamos entender as necessidades do mercado, enxergar aí as possibilidades para a arquitetura. Penso que, daqui para o futuro, teremos de tentar responder a esse novo conceito. É muito difícil mesmo, mas é o futuro. Do contrário, o arquiteto vai ficar limitado a obras como museus e igrejas e, para mim, isso tudo é apenas uma parte do mundo. Eu quero pensar em novas formas de viver, novas formas de fazer compras, de trabalhar. Antes de projetar o Empório Armani de Hong Kong, na China, nunca havia concebido uma megastore. Achei muito interessante fazer o projeto porque pude perceber o que os arquitetos podem fazer pelos leigos, pessoas que estão longe da arquitetura.


aU No Brasil vivemos uma situação dramática em que as imposições do mercado têm criado imensas dificuldades para os arquitetos produzirem um bom trabalho...

FUKSAS O problema é que vocês não devem mudar a si próprios, mas ajudar os outros a entender a arquitetura. Você não precisa ser esnobe, não se trata disso. Mas, se você teve acesso a uma boa formação, tem cultura, tem também o dever de ajudar os outros. Vivemos um momento em que as cidades precisam de arquitetura. De arquitetura e de arte.


aU Na Bienal de Veneza de 2000, você mostrou uma visão bastante catastrófica sobre as grandes cidades. Permanece essa opinião?

FUKSAS Penso que o problema são as megalópoles.


aU As megalópoles?

FUKSAS Exato. Eu ainda defendo que não se pode construir sobre o planeta inteiro, mas, sim, concentrar e conferir identidade aos lugares. As megalópoles são algo à parte e devem ser consideradas como um objeto, uma escultura, e não como um aglomerado de prédios bonitos que você vê numa viagem de turismo.


aU Não sei se ficou claro...

FUKSAS É preciso mudar completamente de abordagem porque agora estamos falando de outra coisa, não de arquitetura, mas do conceito de colossal. Não há mais espaço para obras de arquitetos como Andrea Palladio, como o Coliseu, por exemplo. O conceito de todo o complexo da megalópole é muito forte porque é colossal. Trata-se de uma nova estética. A dimensão é uma nova estética.


aU Que solução você propõe?

FUKSAS A solução é aceitar, proporcionar mobilidade e aumentar a densidade das megalópoles.


aU Algo na linha de Manhattan?

FUKSAS Manhattan é arcaica. É arcaica porque é história. A megalópole é algo novo e que não conhecemos. Na minha opinião, o desenho urbano deveria adquirir uma escala bem maior do que a atual: em vez de pequenos e numerosos quarteirões para mil pessoas, por exemplo, deveríamos adotar grandes blocos em que coubessem 20 mil pessoas.


aU Você pode dar um exemplo?

FUKSAS Não, porque não há um exemplo. Isso poderia ser uma utopia dos anos 60. É uma pena que a utopia tenha sido deixada de lado, porque é uma parte importante da reflexão. Hoje a reflexão é feita de forma muito acadêmica. A arquitetura se tornou pragmática, realizada dentro do possível, enquanto a discussão ficou num nível muito acadêmico.


aU Você incorpora ao seu trabalho conceitos como leveza, transparência e comunicação. Você cosidera que essa abordagem poderia ser um caminho para a megalópole?

FUKSAS Algumas vezes precisamos de leveza e transparência, outras, de espaços fechados, cegos e até artificiais, sem iluminação natural e climatizados. Talvez não existam lugares assim em Roma ou no Brasil, mas isso já ocorre em ambientes como aeroportos e shopping centers.


aU Você já esteve no Brasil?

FUKSAS Sim. Já visitei São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Belo Horizonte. Em 1998 fui passar o carnaval na Bahia. Atravessei o País em um Volkswagen a álcool. Foi uma viagem fantástica. Mas foi em São Paulo que vi o edifício mais surpreendente de minha vida, aquele museu projetado por aquela senhora italiana... (Fukas refere-se ao do Masp - Museu de Arte de São Paulo - de Lina Bo Bardi).

MASP 


aU E qual a sua opinião sobre a arquitetura brasileira?

FUKSAS O Brasil teve uma arquitetura muito forte nos anos 60. Era realmente inacreditável! Mas não sei muito sobre a produção da nova geração de arquitetos brasileiros que, assim como a dos latino-americanos, não é muito divulgada aqui na Europa. Já vi alguns bons exemplos, mas não é possível criar um conceito a partir de tão pouca informação.

Fonte: Revista AU
Fotos:
Massimiliano Fuksas: Moreno Maggi
Masp: Oliveira Júnior

sábado, 11 de dezembro de 2010

Acidente no Aeroclube da Paraíba

Conflito de interesses urbanos
Oliveira Júnior

Imagem: monomotor tombado
Foto: Ricardo Oliveira
Fonte: Portal Paraíba

Um conflito de interesses entre o Aeroclube da Paraíba, o mercado imobiliário e a vocação urbana da cidade de João Pessoa volta a ficar em evidência na mídia paraibana após a queda de um monomotor ontem pela manhã nas proximidades do aeroclube.
O Aeroclube da Paraíba foi criado em 1940, no antigo campo da Imbiribeira (Tambauzinho), onde hoje se localiza o Espaço Cultural José Lins do Rego, extendendo-se até as imediações do Primeiro Grupamento de Engenharia e Construção na Avenida Epitácio Pessoa.
Em 1953, com o iminente crescimento urbano em torno do eixo da Avenida Epitácio Pessoa, o Governador José Américo de Almeida, desapropriou a antiga área e a idenização permitiu que o aeroclube adquirisse um terreno desmembrado da Fazenda Ribamar ou Boi Só, onde atualmente se localiza. Na época a área  escolhida para implantação deste equipamento era pouco habitada, a população ainda começava a se deslocar rumo a orla e a cidade se apresentava morfologicamente horizontal.

Imagem: Vista aérea do aeroclube e entorno urbano
Foto: autor desconhecido

Com o adensamento populacional e a valorização imobiliária dos bairros da orla, as construtoras locais iniciaram um processo de verticalização intenso que culminou no "estrangulamento" do "cone de vôo" do Aeroclube da Paraíba e desencadeou uma série de disputas jurídicas na área.

Imagem: Vista aérea do aeroclube e entorno urbano

Foto: autor desconhecido

Numa das ações a Justiça Federal mandou demolir 19 prédios de luxo no entorno do Aeroclube da Paraíba que teriam extrapolado a altura máxima permitida para aquela área.

Um aspecto a ser considereado nesta queda de braço é a vocação atual do entorno urbano daquele trecho de João Pessoa. Tão importamte quanto as questões da vulnerabilidade e da insegurança dos moradores dos edifícios próximos ao aeroclube é a reflexão sobre qual seria o uso mais apropriado para o vazio urbano onde está inserido o equipamento.

No ambiente acadêmico a questão do espaço do aerodromo já foi abordado pelas disciplinas de desenho urbano e por  trabalhos finais de graduação (TFG's) de alunos do Unipê, por exemplo. Diante da carência de praças e espaços públicos de lazer, alguns alunos orientados pelo arquiteto Ernani Henrique Júnior já propuseram intervenções para o local. Maurício Montenegro sugeriu a remoção do aeroclube para a região sul, muma área mais remota da cidade; já  Beatriz Campelo desenvolveu uma proposta de um parque urbano no local. Hipótese, inclusive, destacada em vários meios de comunicação com após a sanção da lei 11.854 pelo ex-prefeito Ricardo Coutinho no início deste ano.

O aeroclube sempre se posicionou firmemente pela sua permanência no local. Inclusive, estrategicamente, sua diretoria batizou-lhe de “Aeródromo José Targino Maranhão” e posteriormente, em outubro de 2008, conferiu o título de sócio de benemérito ao prefeito Ricardo Coutinho, que não se deixou seduzir pelo mimo diante das suas convicções urbanísticas.

Enquanto a polêmica não se resolve a população fica exposta aos riscos de um acidente aéreo de maiores proporções e subtraída do direito aos tão caros espaços de lazer públicos de que precisa para usufruir da sua plena cidadania. 

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Dia do arquiteto

Não importa o que você faça, só que faça diferença.

A imagem de um papai noel publicada hoje no portal G1 revelando-o sem as suas vestes tradiconais me reportou a máxima de que por trás de todo indivíduo há um ser humano único e me inspirou a escrever este curto texto. Sua pele tatuada, impossível de ser percebida abaixo da indumentária com a qual se traveste, é uma metáfora que remete ao verdadeiro "eu" oculto nos anônimos rostos dos transeuntes. Reconhecê-los, identificar suas legítimas necessidades e incorpora-las nas estratégias de ação projetual são os os principais objetivos profissionais do arquiteto. Acima de qualquer idiossincrasia estão os verdadeiros interesses sociais e coletivos da cidade.

"Por trás de todo indivíduo há um ser humano único."
Vitor Martins é artista plástico e trabaha como Papai Noel há 10 anos.
Foto: Paulo Toledo Piza
Fonte: Portal G1

Toda ação projetual interfere diretamente na relação singular que cada indivíduo trava cotidianamente com os espaços públicos e privados. Esta relação pode se subverter em vitalidade ou "desertificação urbana, coesão ou segregação socio espacial, integridade física e emocial ou medo e insegurança, sustentabilidade e conforto ou caos e crescimento desordenado.

Esperamos que o dia dedicado aos arquitetos seja um momento de reflexão sobre o nosso verdadeiro papel na sociedade. Desejamos que o "encantamento" com a profissão nos tome de "assalto" para que possamos (re)construir as nossas cidades com o vigor e a justiça social que todos merecemos.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Memorial Darcy Ribeiro

UnB realiza rodada de seminários em celebração à inauguração do Memorial Darcy Ribeiro



Programação para celebração à inauguração do Memorial inclui palestra do arquiteto João Filgueiras Lima (Lelé), autor do projeto da obra recém-inaugurada

Mauricio Lima


Nos dias 9 e 10 de dezembro, das 9h00 às 18h00, será realizado o Seminário em celebração ao Memorial Darcy Ribeiro, na Universidade de Brasília (UnB). O memorial, que foi inaugurado hoje (6), com a presença dos presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e do Uruguai, José Mujica, foi projetado pelo arquiteto João Filgueiras Lima (Lelé), amigo pessoal de Darcy Ribeiro. As palestras terão como tema o trabalho e a vida tanto de Lelé como de Darcy.


O formato é inspirado em uma "maloca de índio" e em um "disco voador"

O projeto
O local vai abrigar um acervo de mais de 30 mil livros herdados do antropólogo e fundador da universidade. A construção do projeto foi estimada em cerca de R$ 5 milhões.

Apesar de ter sido apresentado em 2009, o projeto foi desenvolvido entre 1995 e 1996 com o auxílio do próprio Ribeiro, que morreu em 1997. O memorial possui dois andares de biblioteca, espelho d'água, salas de aula, climatizador e iluminação natural, proporcionada por uma grande claraboia.





O formato circular, de acordo com Lelé, é inspirado em uma "maloca de índio" e em um "disco voador", e fazem alusão às duas faces de Darcy, respectivamente: ao antropólogo que conviveu anos em aldeias indígenas e ao realizador, que está sempre à frente na tecnologia.
Além dos espaços de estudo, por desejo do próprio fundador da UnB, o memorial também tem um espaço para descanso e apresentações. O local fica do lado oposto do acesso, sendo composto de arquibancada, palco para apresentações, sanitários e salas que podem servir de camarim.

Confira a programação:
Dia 09
9h00 às 10h00 - Abertura do Seminário
Reitor da UNB
Presidente da Fundação Darcy Ribeiro
Diretor da FAU/UNB
Diretor do ICS/UNB

10h00 às 11h00 - Palestra Inaugural
João da Gama Filgueiras Lima (Lelé)
15h00 às 15h30 - Antropologia e Política: a trajetória de Darcy Ribeiro
André Borges de Mattos

15h30 às 16h00 - O Intelectual das Muitas Intervenções. A Educação no Brasil de Darcy Ribeiro
Helena Bomeny

16h30 às 17h00 - A Tecnologia sob um Novo Olhar
Maria Elisa Costa

17h00 às 17h30 - O Mestre-Construtor
Yopanan C. P. Rebello e Maria Amélia D. F. D'Azevedo Leite

Dia 10
9h00 às 9h30 - João Filgueiras Lima: Arquitetura no Limite
Ana Luisa Nobre

9h30 às 10h00 - Herói Desconhecido
André Corrêa do Lago

10h30 às 11h00 - Lelé: O criador, o construtor, o contexto
Hugo Segawa

11h00 às 11h30 - As Casas dos Amigos
Cláudia Estrela Porto

15h00 às 15h30 - Interconexões entre Ciência e Afeto. Berta Ribeiro: a Antropologia e a Causa Indígena
Maria Stella de Amorim

15h30 às 16h00 - Proteger os Índios e Descolonizar a Pesquisa. Darcy Ribeiro como Antropólogo
João Pacheco de Oliveira

16h30 às 17h00 - Darcy Ribeiro e a Universidade de Brasília
Geralda Dias Aparecida

17h00 às 17h30 - O Lelé na UnB
Andrey Rosenthal Schlee

Serviço:
Seminário em celebração ao Memorial Darcy Ribeiro

Data: 9 e 10 de dezembro
Horário: 9h00 às 18h00
Local: Anfiteatro 12 da UnB

Fonte: Piniweb
Imagens: Piniweb e Minsitério da Cultura

domingo, 5 de dezembro de 2010

A nova faceta de Niemeyer

Às vésperas de seus 103 anos, Oscar Niemeyer se lança como compositor e faz música com Edu Krieger



RIO - Internado no fim do ano passado para cirurgias na vesícula e no intestino, Oscar Niemeyer procurava uma forma de driblar o tédio do leito de hospital. O homem que - a despeito de ter desenhado Brasília e outros marcos da arquitetura brasileira, aqui e espalhados pelo mundo - continua trabalhando às vésperas de seu 103 aniversário escolheu lançar-se num novo ofício: o de compositor. Começou a esboçar uma letra, seu enfermeiro Caio Almeida, uma melodia, e nascia assim o samba "Tranquilo com a vida", mais tarde finalizado por Edu Krieger - a canção será lançada digitalmente pela Deck no máximo até o dia do aniversário do arquiteto, 15 de dezembro.

- Não sei como encontro tempo para ficar brincando - diz Niemeyer, rindo. - Mas minha música é uma besteira, uma coisinha divertida, nada importante. Sempre fui muito ligado a esse pessoal do samba e quis fazer alguma coisa louvando o homem da favela.

Empolgado com a parceria, Krieger, ao contrário, não vê a canção como "uma bobagem":

- Independentemente do que aconteça na minha vida, já defini que não terei parceiro mais ilustre. Afinal, a importância histórica de Niemeyer é incomparável. E, além disso, acho fantástico ele estar nascendo como sambista agora, sendo mais velho que Noel Rosa e Adoniran Barbosa. Compor com ele é como estar envolvido por aquela aura mítica dos meus mestres do samba.


A proposta da parceria chegou a Krieger via Caíque Niemeyer, bisneto do arquiteto - namorado de uma amiga do compositor e admirador de seu trabalho. O samba estava parado havia alguns meses. Niemeyer e Caio - em sua primeira incursão no terreno - não sabiam como continuar a canção. Caíque então sugeriu o parceiro ao bisavô. Sugestão aceita, ele mandou a letra e o princípio de melodia a Krieger.

- Não mexi em nada da letra, fiz questão de deixar cada palavra que Niemeyer tinha escrito. Finalizei a melodia e fiz a harmonia em dois dias. Depois, gravei uma demo, para ele conhecer. A receptividade foi enorme, ele me convidou para ir ao seu escritório e passamos algumas horas juntos só cantando o samba. Mais tarde, fiz a gravação definitiva chamando amigos da Lapa como Alessandro Cardozo (cavaquinho), PC Castilho (flauta), Fabiano Salek >ita<(percussão), Elisa Addor e Alice Passos (coro). Soube depois que ele mostra a gravação a cônsules, todos os visitantes ilustres que recebe lá - conta o artista de 36 anos, 66 a menos que Niemeyer. - Ficou com cara de samba do subúrbio, simples, direto, tipo Zé Luiz do Império, algumas coisas do Martinho.
A letra de "Tranquilo com a vida" é fiel às ideias que o comunista Niemeyer tem defendido ao longo de sua trajetória. Enquanto aproveita os prazeres simples da vida, o personagem, um morador da favela que canta em primeira pessoa, se dá conta das injustiças do mundo. No fim, conciliatório, diz não culpar os ricos e imagina um futuro com igualdade social.

- Está ali tudo o que ele vem dizendo nas últimas décadas. Um olhar mais atencioso para os pobres, melhor distribuição de renda... Isso só aumenta o valor histórico da música - avalia Krieger. - Ele se coloca como um personagem morador de favela, nunca perdeu a ligação com esse olhar. E, o mais bonito, continua esperançoso. De forma simples, os versos contêm uma esperança de que a diferença de classes se atenuará e as pessoas se reaproximarão. Não há o rancor de outras canções que trazem um tom político. É uma canção de protesto, mas que oferece flores à sociedade. É o reflexo de uma sabedoria de 103 anos.

As palavras de Krieger sobre o papel da experiência na visão de Niemeyer ganham mais força quando se ouve sua única tentativa anterior na área da composição. Em 1962, ele se arriscou no "Samba do arquiteto", no qual conclamava seus colegas de profissão a se juntarem à revolução: "Mas se você é honrado/ Não deve se conformar/ Ponha a prancheta de lado/ E venha colaborar/ O pobre cansou da fome/ Cansou de ter que esperar/ E vai partir para a luta." Bem menos mulato que "Tranquilo com a vida".

Como o próprio Niemeyer lembra, sua relação com o samba vem de muito tempo. São dele os cenários de "Orfeu da Conceição" - primeiro trabalho de Tom Jobim e Vinicius de Moraes juntos. É dele também o desenho do Sambódromo. Sobre o carnaval, aliás, ele já disse que "a escola de samba deveria servir como veículo de protesto, para cantar os anseios da gente pobre". E Chico Buarque afirmou que pensa sua música tendo a obra de Tom e Niemeyer como alvos: "Quando minha música sai boa, penso que parece música de Tom. Música de Tom, na minha cabeça, é casa do Oscar."

"Tranquilo com a vida" será mostrado pela primeira vez num palco no próximo dia 20, quando Krieger se apresenta no Teatro Rival.

- Gostaria muito de ter a presença de Niemeyer lá - diz o artista, que planeja que o samba seja lançado também em versão física. - Talvez façamos depois uma tiragem em CD ou mesmo em vinil.

Apesar de não pensar em dar continuidade à carreira de compositor, Niemeyer diz que tem estado bastante próximo da música:

- Comprei um piano para o meu escritório. Às vezes reunimos amigos lá, fazemos uma batucada. Para esquecer um pouco o mundo, que está uma merda - diz, antes de completar, otimista como a letra de seu samba: - Mas vai melhorar.

Fonte: oglobo.com 
Foto:  Alfredo Alves

sábado, 4 de dezembro de 2010

Concurso Nacional

Sede do CRA-SC








PROJETO CONCURSO NACIONAL DE ANTEPROJETOS DE ARQUITETURA P / SEDE DO Conselho Regional de Administração - SC
Arquitetos ANTÔNIO CLÁUDIO MASSA, CAIO LEITE, MARTINS KLEIMER, VALVERDE LEONARDO, Márcio LUCENA, QUEIROZ RAFAEL, TADEU DE BRITO E THIAGO BEZERRA
COLABORADORES ANTÔNIO FARIAS JÚNIOR E CIRO OTHON
LOCAL FLORIANÓPOLIS SC
MODELAGEM 3D OTHON CIRO
Croquis 3D OTHON CIRO MARTINS E KLEIMER
Maquete 3D BRANCA ANTÔNIO FARIAS JR
IMAGENS 3D CAIO LEITE, LEONARDO VALVERDE E CIRO OTHON
ANO 2010

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

China - arquiteto cria casa em forma de ovo

Residência de Dai Haifei custa pouco mais de R$ 1.700.
Feita à base de bambu, ela é à prova de calor e água.

O arquiteto chinês Dai Haifei, de 24 anos, dentro de sua casa-móvel em forma de ovo, em que ele vive a cerca de dois meses em Pequim, com o objetivo de economizar aluguel. (Foto: AFP)

A casa custou cerca de US$ 1.000 e é feita de bambu e colchões,cobertos de material à prova de calor e água. Ela também tem partes com cascas de árvore e sementes de grama, que podem crescer durante a primavera, cobrindo a construção. (Foto: AFP)

Fonte: Portal G1

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

HELP, Senhor!
( a propósito da guerra contra o tráfico no Rio)
José Wolf



A capa emblemática da última revista IstoÉ  mostra o Cristo Rendentor, uma das sete maravilhas do mundo, com colete à prova de bala, traduz, sem dúvida, a realidade verdadeira que vivemos, seja, no Rio, em São Paulo, Recife, João Pessoa etc. Ou seja: o da violência urbana . Resultado, segundo analistas, da ausência do Estado em áreas, como o da educação, saúde, habitação, saneamento básico e ambiental etc.

Assim, a ocupação do chamado complexo do Alemão, no Rio, revelou, pra começar, conforme observa o arquiteto Mario Sérgio Pini, fundador da revista AU , a ausência de um desenho e planejamento urbanos para uma população condenada a viver entre becos, ruelas e habitações precárias, em meio ao lixo e ao abandono social.

A propósito, uma indagação: o que tem feito o Ministério das Cidades em benefício dessas populações à margem de tudo?, Ministério, por sinal, que segundo a mídia, continua, um dos mais cobiçados pelos partidos parceiros da nova gestão administrativa federal.

Diante desse cenário de “Tropa de Elite”, IV, só nos resta implorar :Help, Senhor!

domingo, 28 de novembro de 2010

Estado x violência urbana - o negócio da violência

DOS BARÕES AO EXTERMÍNIO
Sociólogo afirma que a violência e o crime organizado tornaram-se grandes negócios, inclusive para o Estado
Francisco Dandão



De passagem por Rio Branco, para participar da I Semana de Extensão da Universidade Federal do Acre, onde falou sobre Extensão Universitária, Políticas Públicas e Ações Afirmativas, o professor José Cláudio não se esquivou de responder algumas perguntas sobre o assunto, ao mesmo tempo instigante e perigoso, que ele pesquisa há quinze anos.

Abaixo, os principais trechos da entrevista.


Eu gostaria que você falasse, inicialmente, sobre a sua tese de doutorado... Sobre como é que surgiu a idéia de fazer um trabalho dessa natureza.

José Cláudio - Eu tinha uma militância já de algum tempo na Baixada Fluminense. Eu tenho uma trajetória de vida que me levou à Baixada. Eu sou de Vigário Geral, que é um bairro também muito violento. E quando eu fui para a USP, o meu projeto não era estudar a Baixada, mas sim a questão da esquerda no Rio de Janeiro. Na época, entretanto, caiu em minhas mãos um livro que me marcou muito, de um autor chamado Mike Davis, um dublê de urbanista e caminhoneiro. Esse cara tem um livro chamado “Cidade de Quartzo”, que faz um retrato da cidade de Los Angeles, a partir da forma como o poder foi se organizando no local, ao mesmo tempo em que mostra como esse poder se consolida, através de várias estratégias. E foi aí que eu pensei em fazer alguma coisa semelhante com relação à Baixada Fluminense, um local onde se registram os mais altos índices de violência do mundo: são cerca de 80 homicídios anuais para cada cem mil habitantes. Ou seja, um padrão superior a qualquer região onde exista uma guerra. A ONU classifica 50 assassinatos por cem mil habitantes como situação de guerra. Foi a partir dessas constatações que eu pensei que não era possível chegar a um padrão de violência desse patamar se não fosse por conta de algum tipo de construção. E aí, então, ficou muito forte dentro de mim o desejo de proceder a uma investigação acadêmica para compreender melhor o fenômeno. Essa seqüência de fatores é que culminaram na tese.

E no que diz respeito aos riscos que você correu para realizar a pesquisa... Fale um pouco sobre isso.

José Cláudio - A pesquisa traz riscos naturais, por conta de você estar no campo procurando informações. No meu caso, eu fiz muito trabalho em arquivos de jornais e peguei também o precioso arquivo de um bispo, já falecido, D. Adriano Hipólito, que era um homem corajoso, um homem que chegou a denunciar o Esquadrão da Morte. Por conta das denúncias dele, aliás, ele foi seqüestrado, pintado de vermelho e solto despido numa vila militar. Seqüestro que ele atribuía aos próprios militares. Mas ele nunca silenciou e, ao contrário, criou um vasto arquivo com matérias de jornais, o que foi primordial para o meu trabalho. Eu entrevistei o Hélio Luz, que foi titular da Delegacia de Homicídios da Baixada... Entrevistei também a Tânia Maria Salles Moreira, que foi a promotora que levou à condenação vários líderes de grupos de extermínio... Mas eu nunca sofri ameaças. É certo que as pessoas com quem eu tive contato demonstravam sempre muito medo do que poderia acontecer a mim e a minha família... Mas, o que eu penso é que o meu trabalho, apesar de levantar questões para a compreensão e o esclarecimento da situação da violência, principalmente na Baixada Fluminense, acaba não incomodando a eles. O controle deles sobre a população e muito grande, eles tem a máquina de recursos públicos e a maioria hoje nem é mais formada por matadores, agora todos tem outras trajetórias. Talvez eu corresse algum risco só se eu fosse testemunha de acusação de algum dos crimes praticados por alguém desses grupos. Por enquanto eu ainda não sofri nenhum tipo de ameaça.

O sociólogo Francisco de Oliveira, um dos membros da banca avaliadora, quando da defesa da sua tese, fez algumas críticas ao seu trabalho. Eu gostaria que você comentasse a pertinência ou o eventual despropósito dessas críticas.

José Cláudio - As críticas foram muito pertinentes. Francisco de Oliveira me coloca dentro de uma tradição teórica da sociologia. Ele percebe a originalidade do meu trabalho, percebe a idéia de uma lógica que vem, principalmente, de Karl Marx, cujo pressuposto é o de que o Estado é constituído essencialmente a partir da violência. Eu não fujo disso. Eu vou buscar a fonte da constituição desse Estado, desse poder, calcado na violência. O que ele, de fato, percebe são algumas impaciências da minha parte, no trato dessa temática. Por exemplo, no momento em que trato do Brizolismo como muito rigor e com muita dureza, Francisco de Oliveira diz que não se pode pedir comportamento muito diverso de quem está no poder, levando em conta a essência da constituição do Estado. O próprio Estado é o crime. Todos os que estão presos ou a maioria dos que são assassinados pertencem à ponta de baixo do iceberg. Não é possível, de fato, chegar ao topo da pirâmide, chegar naqueles que, realmente, controlam o crime. A violência e o crime organizado se tornaram grandes negócios, inclusive para o Estado. A crítica maior do avaliador foi a de que muitas vezes eu não demonstro tolerância com as ações de pessoas ou de grupos que detém ou fazem parte do sistema de poder. Críticas absolutamente pertinentes.

No seu entender, é possível ainda uma sociedade brasileira harmoniosa ou isso não passa de uma utopia de poetas românticos?

José Cláudio - O que mantém a gente vivo nesse mundo é acreditar que ainda é possível transformar essa realidade. É possível sim, mas eu creio que o trabalho de construção dessa sociedade harmoniosa é muito difícil e lento. Eu acho que vai demorar muito para a gente conseguir estruturar outro tipo de sociedade. A lógica de uma revolução, de uma mudança pelas bases, de uma mudança radical das classes que dominam esse país ainda está muito longe de acontecer. Nós não temos hoje uma conjuntura ou uma junção de fatos que nos levem a uma revolução. Hoje, o partido que eu ajudei a criar e ao qual eu dediquei vinte anos da minha vida, que é o Partido dos Trabalhadores, desde que o Governo Lula assumiu o poder, perdeu essa possibilidade transformadora. Ele se associou justamente a esses grupos políticos que dominam o país. Ele estabelece uma lógica de clientela, como é o caso da Bolsa-Família. Ele estabelece políticas compensatórias, clientelas assistencialistas, de um lado, e do outro lado ele mantém a lucratividade dos maiores setores econômicos desse país. O PT se vinculou a grupos políticos diretamente envolvidos com a violência, com o controle político desse país. O PT se associou a banqueiros e grupos econômicos que hoje ganham dez vezes o que é gasto com a Bolsa-Família, para atender 36 milhões de brasileiros. Dez vezes mais o que é gasto com esse programa é dado de lucratividade a banqueiros. Se houve aumento de empregos, foi por conta da grande fluidez do mercado mundial. Mercado esse que agora se encontra em plena crise. Por conta disso, o próprio governo já começa a falar em cortes dos programas sociais. É uma falácia, então, você manter uma estrutura de política social calcada num mercado que é altamente vulnerável. Então, o que eu percebo é que não temos hoje uma estrutura revolucionária. O Estado, que poderia ser um agente de consolidação de uma classe econômica desfavorecida, através de políticas sociais mais sólidas, simplesmente não o faz.

O repórter Carlos Dorneles deu o seguinte título a um dos seus livros: Deus é Inocente. A imprensa, não. No que se refere à violência no Brasil, quanto de culpa se pode creditar à mídia?

José Cláudio - Eu acho que a mídia trabalha numa dupla lógica: uma lógica de mercado e uma lógica de patrocínio. A lógica de mercado, com respeito a quem consome a matéria, qual o grupo social para o qual estou produzindo as minhas informações, qual o interesse desse grupo social, o que eu digo pra ele... É nesse sentido que existe essa mídia que perpetua o discurso das classes perigosas, dos grupos violentos, que perpetua a lógica da execução sumária como prática de segurança do Estado. A violência é um excelente produto para essa mídia, porque tem um público ávido em consumi-lo. As matérias são muito direcionadas para esse fim, para a espetacularização da informação, sendo que no final das contas o público acaba sabendo muito pouco do fato. Você vê esse caso da Eloá e do Lindemberg: é quase uma crônica de uma morte anunciada. A espetacularização de um drama, sem nenhum aprofundamento do caso. No fim das contas, o público não sabe nada de quem são aqueles personagens. A mídia praticamente apenas radiofonizou uma ação no momento presente. A mídia não faz o discurso do aprofundamento, da educação, da qualificação da informação. A mídia é quase uma vendedora imediata de um produto também imediato e vendável, que é a violência em tempo real. Por outro lado, essa mídia vive o segundo elemento, que é o seu patrocinador, que são os grupos políticos e econômicos que querem perpetuar as suas imagens. Isso tudo é muito lamentável!

Dostoievski teria alguma possibilidade de sucesso se vivesse no Brasil do século XXI e tentasse publicar uma versão pós-moderna de Crime e Castigo?

José Cláudio - Crime e castigo... Quem são os criminosos e quem são os castigáveis nesse país? Nunca se chegará aos grandes empresários, grandes comerciantes e grandes banqueiros que financiam as grandes partidas de cocaína, assim como não se chegará àqueles que fazem tráfico de armas pesadas nesse país. Por que é que entra um “caveirão” blindado numa favela? A alegação é porque lá existem armas de grosso calibre. Essa justificativa é só para os governos subirem e matarem dezenas de pessoas a cada semana. Só que quando eles resgatam essas armas, dias depois essas mesmas armas estão de volta nas mãos dos traficantes. O problema é que quem vende essas armas para os traficantes é a própria polícia. Então, crime e castigo é exatamente o que nós temos nesse país. Só que são duas lógicas separadas: os criminosos vão muito bem, obrigado, perpetuados na sua ação assassina e na sua política genocida; e, do outro lado, aqueles que são os executáveis. O castigo recai exatamente sobre as vítimas desse sistema. Alguns autores que se debruçaram sobre esse tema da violência dizem que é uma espécie de profecia autocumprida. Ao tempo em que você lê a profecia, ela vai se cumprir porque você passa a fazer parte dela. No Brasil é exatamente essa a contradição que temos por aí.

Em se tratando de violência, meu caro José Cláudio, é possível se afirmar que Deus e o diabo andam de mãos dadas, em perfeita sincronia, na terra do sol?

José Cláudio - Deus e o diabo são associados. É claro que se tem que ver quem é esse deus e quem é esse diabo. Na literatura alemã existe um livro belíssimo do Franz Neum, chamado Behemot, que é a história do nazismo. Esse Behemot é um deus que se alimentava de sacrifícios humanos. Eu acho que no Brasil o Behemot é o Estado, a classe dominante... Esse é o deus que é cultuado aqui, sem nós sabermos. Ele se alimenta de sacrifícios humanos. Milhares de pessoas são sacrificadas nesse país, executadas sumariamente aos pés desse deus. O diabo nada mais é do que o seu irmão gêmeo, siamês, que está também perpetuando o mal, através da sua lógica mais perversa, a lógica da separação. Não tem coisa pior nesse país do que essa prática da violência, que separa o povo todo, de fora a fora, de cabo a rabo: separa os pobres dos pobres, separa os pobres trabalhadores dos pobres depois chamados de bandidos, separa a classe média das classes populares, separa a elite do que ela quer separar também... É tudo extremamente fragmentado. O Partido dos Trabalhadores, nesse sentido, deveria ser um partido que unificasse todos esses segmentos, mas, ao contrário, ele acaba sendo mais um fragmento que bebe dessa água. O diabo, então, é a separação do país. Se deus é Behemot, que se alimenta da carne dos pobres, o diabo é a entidade que está fragmentando cada um desses grupos sociais e que impede qualquer manifestação conjunta que possa derrubar toda essa estrutura de poder.

Por último, dado todo o seu conhecimento sobre essa questão da violência no nosso país, eu gostaria que você respondesse se ainda é possível amar o Brasil ou se nós temos que deixá-lo o mais rápido possível...

José Cláudio - Há algum tempo eu comecei a desenvolver uma síndrome. Nenhum médico descobria, exatamente, o que era que eu tinha. Até que um dia foi descoberto que o meu mal estava ligado à depressão. Tudo por conta de que, ao longo do tempo, todas as denúncias que eu fazia no livro se configuravam vãs. Ao contrário de terminar, toda a estrutura das mazelas que eu denunciei se fortalecia. Então, como eu era uma pessoa que esperava que o Brasil mudasse, fui percebendo que as minhas alternativas eram cada vez menores. Eu fui definhando e achei que já não havia mais sentido viver aqui nesse país. Chegou um momento em que eu perdi o sentido de caminhar entre os humanos. Eu estava querendo viver uma outra realidade. Porém, graças a Deus, eu hoje curei essa doença. E eu penso que comecei a me curar quando eu comecei a prestar atenção em pessoas totalmente arrebentadas pelo sistema brasileiro, mas que eu podia ver que dentro delas ainda restava muito de alegria e esperança. Dá pra perceber que essa gente consegue construir algo, e que apesar de a gente não saber como, o certo é que eles constroem esse algo. Penso que foi isso que eu consegui perceber: uma dimensão subjetiva, espiritual, da qual eu comecei a me alimentar também. Eu poderia dizer que construí a minha possibilidade de sobrevivência dessa esperança que vem da população mais pobre, vitimizada e vilipendiada pelo Estado brasileiro. Então, mesmo que não seja possível amar, pelo menos se pode permanecer, sim, nesse país. “A escuridão me ilumina, hoje eu sou poeta”. Isso é Manoel de Barros. Agora falando eu mesmo: a sujeira me limpa nesse país.