sábado, 10 de março de 2012

Arquitetura & Realidade

A SEMANA QUE ABRIU AS PORTAS PARA A MODERNIDADE BRASILEIRA
José Wolf 

Há 90 anos, acontecia em São Paulo, a Grande Semana de Arte Moderna. O evento, segundo os críticos, representou a carta de alforria de independência da cultura brasileira, ao se libertar do domínio cultural europeu.  Evento que ocorreu no Teatro Municipal, projeto do engenheiro-arquiteto Ramos de Azevedo inaugurado em 1911 e que, agora,  acaba de ser revitalizado.

Imagem: Teatro Municipal

A Semana, na opinião do cineasta e crítico Arnaldo Jabor, entrevistado pela CBN,  acabou ao longo dos tempos, numa espécie de efeitos colaterais, fecundando movimentos e transformações culturais significativos, como a valorização do folclore popular, do barroco mineiro, a Tropicália, o cinema novo e, inclusive, a Arquitetura Moderna brasileira. 

Imagem: Casa Modernista da rua Itápoli (Gregori Warchavchik,)

A Casa Modernista, de Gregori Warchavchik, de 1923, cujas linhas retas e racionalistas provocaram a ira de arquitetos acadêmicos da época,  também só foi possível graças a esse sopro de renovação. Vale ressaltar que o folclore foi supervalorizado pela divina Janete Costa, autora do livro “Viva o povo brasileiro”, ao incluir em seus projetos de interiores elementos da cultura popular nordestina, a exemplo do hotel Marabá, em São Paulo.

Imagem: Janete Costa

A propósito, o folclore, além de elementos arquitetônicos vernaculares, esculturas e pinturas, que foram tão celebrados por arquitetos, como Lúcio Costa, Borsoi, Severiano Porto, Oswaldo Bratke, Lelé, Assis Reis, João Castro Filho, Sérgio Bernardes, Zanine Caldas, Gérson Castelo Branco, Mílton Monte, entre outros, acabaram sendo diluídos por uma produção arquitetônica sem DNA e identidade nesta pasteurizada era global.

A Grande Semana, enfim, reuniu expoentes intelectuais, entre os quais, o poeta Mário de Andrade, o principal articulador do evento, autor do emblemático Macunaíma, um herói sem nenhum caráter. Que, na interpretação de muitos, seria a tradução do perfil  e índole do povo brasilerio caracterizados pela irreverência, sensualidade, malícia, indolência, malandragem e ingenuidade.

Imagem: Mario na rede (lasar Segall)


Macunaíma, inclusive, foi tema de um filme produzido por Joaquim Pedro de Andrade, com participação  do inesquecível Grande Otelo. 

Imagem: Grande Otelo em cena do filme Macunaíma 

O hit de sucesso “Ai, se eu te pego”, de Michel Teló, seria um refexo atual dessa doce malícia de duplo sentido, assim como foi o “Vira-Vira”, do Mamomas Assassinas. Ou o grito de guerra  “Teeresinhaaa”! do saudoso Chacrinha. Assim, como, foi a canção “Eu vou pra Maracangaia”,  de Juca Chaves sobre JK e Brasília.. Ou, ainda, os filmes do “caipira “Mazzaropi, a exemplo do “Jeca Tatu” e “O corintiano”, que, apesar de marginalizado  pela crítica, levou multidões aos cinemas. E, também, as coreografias arquitetônicas do genial Paulo Barros, da Unidos da Tijuca, que deverá coreografar a solenidade de abertura da Copa de 2014.

Imagem: Carro alegórico da Unidos da Tijuca (2012)

Além de Mário, participaram da Semana, o poeta Menoti del Picchia, Oswald de Andrade, autor do polêmico “Paulicéia desvairada” e da peça “O rei da vela”, encenada, sob a a direção do iconoclastra  Zé Celso, nos anos anos 70 , pelo teatro Oficina. E Tarsila do Amaral, que depois de sua fase cubista e social, com “Pau brasil” e “Os operários”, inaugurou o movimento antrofágico brasileiro, a tradução mais perfeita, a meu ver, de nosso jeito de ser brasileiro. Do  “to be tupy or not be tupy”.

Para concluir, invocaria o comentário do crítico Franklin de Oliveira, a respeito do cinquentenário da Semana, registrado na publicação “A Grande Semana de Arte Moderna”, coordenada por Yan de Almeida Prado. Ou seja: ¨ ..a melhor maneira de festejar o cinquentenário (e, agora, os 90 anos) da Semana de Arte Moderna seria criar um novo Modernismo”, frente a um cenário cultural e arquitetônico atual tão carente, refém, ainda, de um mercado movido por desenfreada especulação imobiliária e estilos tipo Miami & alhures, sem qualquer identificação com o “espírito “ de algum lugar..


Imagem: O Edifício Habitacional na Rua Simpatia (gruposp) representa o resgate da boa arquitetura imobiliária.



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