domingo, 6 de março de 2011

Triptyque

Nem minimalista, nem maximalista. Arquitetura de emoções

Foto de Marcos Alves
Quando o grupo de estudantes da Escola de Arquitetura Paris-la-Seine — a paulista Carolina Bueno, 35 anos, e os franceses Guillaume Sibaud, Olivier Raffaelli e Gregory Bousquet, 37 — foi ao Rio pela primeira vez, de férias, em 1998, se encantou tanto com o cenário belo e caótico da cidade que decidiu mover o recém-inaugurado escritório de arquitetura, design e arte Triptyque de uma Paris com pouco espaço para impacto arquitetônico para um Brasil repleto de oportunidades criativas. Em 2000, já formados, os quatro abriram o escritório em Laranjeiras, de onde planejaram a fachada da loja H.Stern em Ipanema (Roberto Stern foi o grande descobridor do grupo) e um reformado Museu Histórico Nacional, desenho que nunca saiu do papel por falta de recursos.
Mas o Rio, como bem sabem os cariocas, promete mais do que realiza, tanto que, em 2003, o escritório mudou-se para São Paulo, onde estão o dinheiro e uma enorme demanda por projetos de arquitetura. Aqui, ao longo dos anos, o Triptyque — francês para Tríptico, a definição de três pinturas que integram uma única obra de arte — acabou crescendo com propostas de design arrojado ensopadas de conceitos como sustentabilidade, customização e usabilidade. E se tornou um dos mais festejados e promissores escritórios do país. O Rio, no entanto, nunca saiu da cabeça dos jovens arquitetos.
(Harmonia - Divulgação)
— Rio e São Paulo são cidades novas no formato urbano e um desafio inacreditável — diz Olivier Raffaelli na mesa de reuniões da pequena (e abarrotada) casa no Jardim América que abriga a sede da Triptyque, na capital paulista. — Mas o Rio é perfeito para quem pensa o cenário urbano, porque junta a cidade em si, a natureza ao redor e a mistura social das favelas dentro de cada bairro.
Pois o quarteto — que trabalha todos os projetos em ritmo de brainstorming e colaborações múltiplas — volta agora ao Rio (onde possui um estúdio de computação gráfica e 3D, o TriptyqueLab) para trabalhar seu sonho de cenário urbano. Em dezembro passado, o Triptyque foi um dos selecionados pela prefeitura para o projeto Morar Carioca, uma continuação do Favela-Bairro, que pretende investir R$9 bilhões em dez anos. O projeto decola este ano com a definição das favelas por que cada escritório será responsável. Na empreitada, o Triptyque faz parceria com a Fundação Gol de Letra, dos ex-jogadores Raí e Leonardo, dedicada à educação de jovens carentes.
— Nossa proposta é trabalhar com moradores, lideranças locais e redes sociais para mudar a favela de dentro para fora, estudando as moradias, a topologia e as limitações das comunidades — diz Raffaelli.
 (Fidalga - Divulgação)
O projeto cairá como luva num portfólio premiado internacionalmente — o Triptyque foi um dos vencedores em 2008 do festejado NAJA (Nouveaux Albums des Jeunes Architectes et des Paysagistes), dado pelo Ministério da Cultura da França — e citado frequentemente em diversos blogs e publicações nacionais e internacionais. Já viraram referências projetos como o edifício de escritórios da Rua Harmonia (onde a água da chuva e do solo é tratada e reutilizada pelo prédio, que tem samambaias e trepadeiras nas paredes), vencedor do Zumtobel Group Award por sua sustentabilidade, ou o edifício da Rua Fidalga em que cada apartamento é diferente do outro (selecionado para a Bienal de Veneza de 2009).
Figuras fáceis em revistas são o apartamento do empresário Houssein Jarouche e sua loja de design de luxo MiCasa, que vende outra criação do escritório: a estante Treme-Treme, móvel obrigatório nas paredes antenadas paulistas cujo módulo de dois metros de altura por quatro de largura custa mais de R$40 mil.
(Loducca - Divulgação)
Em 2008, o grupo inaugurou seu braço internacional, em Paris, e a conquista do NAJA lhe abriu as portas para projetos europeus, como a Mediateca de Osny, na França. Lá, participam de 20 licitações por mês, uma cultura da administração pública na base da concorrência sem picaretagens.
— Na Europa, pensa-se em custo, mas também na melhor solução arquitetônica e urbanística para os cidadãos. Não é como aqui, onde tudo é mais ou menos pré-fabricado, e colégios são feitos em modelos de massa sem que isso, no final, represente economia nos gastos públicos e prédios inteligentes — afirma.
O grupo se diz fã da arquitetura brasileira e cita Oscar Niemeyer e Paulo Mendes da Rocha, mas menciona menos a filosofia histórica dos projetos paulistas a partir da década de 50 e mais a decisão de profissionais contemporâneos de não enveredar pela teatralidade arquitetônica que passou a dar o tom de nove entre dez construções nos últimos 30 anos (e citam explicitamente os desenhos do canadense-americano Frank Gehry).
(Treme-Treme - Divulgação)
— Não somos minimalistas nem maximalistas — diz Raffaelli. — Fazemos uma arquitetura de emoções.
E batem palmas para nomes como os dos paulistas Isay Weinfeld e Márcio Kogan. Weinfeld, conhecido pelo rigor crítico sobre o mercado nacional de arquitetura, define o escritório:
— É um grupo de jovens talentosos que está ajudando a mudar a cena arquitetônica de São Paulo.
Há dez anos, quando nasceu, o Triptyque tinha dois clientes. Hoje, seus 45 funcionários se debruçam sobre 40 projetos no Brasil e no exterior. Enveredando pelo urbanismo, novas portas devem se abrir para o grupo, especialmente no Brasil e no Rio.
— Não há muitas oportunidades na França hoje — diz Raffaelli. — Aqui, as chances são muitas.

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