sábado, 25 de setembro de 2010

Arquitetura & realidade

CRACOLÂNDIA: UM CENÁRIO DE DESOLAÇÃO


Ao passar por São Paulo, em companhia de seu sócio Davi de Lima Vaz, para receber o prêmio da Abcem
2010, na categoria Edificações, o arquiteto Oliveira Jr., (a propósito, parabéns!), criador do fantástico blog
ArqrPB, surpreendeu-se com o cenário que viu.

Próximos a edifícios arquitetônicos consagrados pela mídia especializada, como a Pinacoteca do Estado e o
Museu da Língua Portuguesa , de Paulo Mendes da Rocha, além da Sala de Concertos São Paulo, dezenas de jovens e crianças se drogam, indeferentes ao celebrado cenário arquitetônico local. Muitos, inclusive, se refugiam sob as marquises de concreto tão decantadas pela Arquitetura Moderna.

Cracolândia? Cenário da cidade real que o cubano Ítalo Calvino, em seu fantástico “As cidades invisíveis”
previu, ao celebrar as cidades da memória, seus símbolos e becos, quando no capítulo sobre “as cidades ocultas”, fala da cidade do rato lutando contra a cidade da andorinha.

Com sensibilidade, nos deixou uma lição: a cidade deixou de ser um conceito geográfico para se tornar
símbolo complexo e inesgotável da existência e da condição humanas. Ou, conforme reconhece o festejado
arq. holandês Rem Koohas: “a cidade é tudo que nos resta”.

Classificados pela mídia de nóias, presentes em outras cidades do país, também, são consumidores e usuários de drogas, que protegidos por mantas sujas e desbotadas perambulam como zumbis pela cidade Ou se aglomeram em terrenos baldios da maior capital da América do Sul, classificada pelo antropólogo italiano Massimo Canevacci de “a cidade polifônica”. Uma cidade de muitas crenças, idiomas, contradições e tribos. Entre as quais, está a dos nóias.

Foto: Daylife.com



Assim, na condição de morador dessa região, há 30 anos, quero passar aos arquitetos que visitam São Paulo, algumas dicas, a título de uma espécie de cartilha de sobrevivência. Ou seja:

1 ) pra começo de conversa: Afinal, o que significa Cracolândia, que não consta nos compêndios acadêmicos de Arquitetrura? Ao contrário da Dysneylândia, paraíso mágico da fantasia, é o lugar ou território onde se refugiam os usuários do crack. Que dependendo da presença da polícia, podem migrar de um lugar para outro, de preferência para locais próximos a fontes d´água, onde se podem banhar, restaurantes e hóteis, onde podem conseguir um pão ou marmitex, implorando: - Oi, moço, me dá uma moeda para meu café!
Com humor, costumo, responder: - Oi, mano, parece que seu café não é solúvel!

2) continuando a conversa, anotem, algumas gírias do vocabulário da cidade real,que aprendi ao entrevistar
uma assistente social . Confira:
- Nóia?: consumidor ou usuário do crack

- Crack? Droga em forma de pequenos grãos ou pedras resultantes da mistura de cloridrato da cocaina em pó, bicarbornato de sódio, amônia e água destilada, que custa cerca de dez reais.

- Biricutico? São fragmentos da pedra, que custam cerca de cinco reais, que muitos usuários vivem procurando nos buracos das calçadas da cidade.

- Loira? Gíria utlizada para avisar ou advertir sobre a chegada da polícia :

- Cachimbo? Um dos instrumentos utilizados pelo usuário: pode ser um isqueiro vazio, o pedaço de uma
antena ou uma bituca de cigarro.

2 )Advertência: caro amigo, livre-se do relógio, de correntes de ouro e até do celular. E cuidado com a
carteira. Se pegar um táxi, no aeroporto internacional de Cumbica, anote o número da placa do táxi, que utilizar.

3 )Conclusão: quanto mais simples e camuflado você for, melhor!

José Wolf

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