segunda-feira, 26 de julho de 2010

Arquitetura & futebol

MORUMBI: UM ESTÁDIO COM MUITA HISTÓRIA PRA CONTAR
José Wolf *


A Copa de 2010, que nos revelou segredos e belezas da África, acabou. E, agora, José? Agora, já começou o grande circo da mídia e do governo em torno da próxima Copa que deverá ocorrer, no Brasil, em 2014. Que já começa com polêmica e muito tititi!.

De qualquer forma, o futebol continua tema instigante e atual, envolvendo, inclusive, vários escritórios de Arquitetura. Que foram elencados, sem concurso, para reciclar ou construir estádios, em 12 cidades do país, que deverão sediar os jogos da próxima Copa.

Imagem: Proposta para o Estádio do Morumbi - Ruy Othake e GMP
Fonte: Arcoweb



Fora da lista - Junho, 2010: Pra começar, em plena Copa de Futebol, na África do Sul, chega a notícia que abalou arquitetos, como a equipe do competente escritório Ruy Ohtake, escolhido a princípio para reformar o estádio do Morumbi para a Copa de 2014, no Brasil, além de torcedores paulistanos e frequentadores de botequins da região central de São Paulo, onde sobrevivo.

(ou seja)

por decisão do staff burocrático da Fifa, o histórico estádio do Morumbi, em São Paulo, não seria mais sede da abertura da Copa, em 2014, cuja organização já revela problemas de sintonia e atraso de seis meses no cronograma de obras, conforme alerta a mídia. Resta saber por quê?

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Cartão vermelho - Ao contrário do texto “Arquitetura e futebol: um jogo limpo”, publicado no Boletim 65 do IAB/SP, haveria atrás dessa decisão, fatores, interesses políticos, pessoais e financeiros, que extrapolam a questão arquitetônica. Até o presidente Lula, por sinal, se manifestou surpreso com a decisão da Federação Internacional de Futebol.

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Futebol? Futebol, que de acordo com os consagrados cronistas Nelson Rodrigues e João Saldanha, constitui “arte, paixão popular e nacional ” de uma população carente que vive na periferia. Onde, além de um a igreja ou capela, há sempre um campinho de futebol, conforme registrei na pesquisa “Cinema e futebol: uma história em dois campos”, menção honrosa de um concurso promovido pela antiga Embrafilme, nos anos 80.. Periferia ou subúrbio, vítimas, atualmente, da violência e das drogas, conforme alerta o grupo rap Racionais, em “sobrevivendo no Inferno”ou no clássico “Periferia é periferia em qualquer lugar”.

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No banco dos reservas - Um tema ou programa pouco explorado pelos profissionais de Arquitetura. Muitos dos quais permanecem no banco de reservas por ignorância do poder público, da inicitiva privada, da mídia especializada e das próprias comunidades da periferia, que continuam investindo toda sua energia no Carnaval ou no futebol, esquecendo-se da Arquitetura. Que lhes poderia proporcionar maior qualidade de vida espacial, habitacional e humana..

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Morumbi? Segundo o site Yahoo, a palavra vem do tupi-guarani e significa “morro ou colina verde”. Considerado um dos estádios particulares maiores do mundo, construído, nos anos 50, num antigo matagal, no bairro do mesmo nome que acabou se transformando num oásis imobiliário com a construção de mansões de alto padrão, mesmo convivendo com favelas, foi inaugurado no dia 2 de outubro de 1960, alguns meses depois da inauguração da nova capital Brasília, que mudou a escala da produção arquitetônica do país.

Imagem: foto aérea do Estádio do Morumbi
Fonte: http://imprensa.spturis.com



Show de bola etc.. Conforme registra o clássico “Arquitetura Moderna Paulistana”, de Alberto Xavier, Carlos Lemos e Eduardo Corona, a construção do estádio, projetado pelo mestre Vilanova Artigas e seu parceiro Carlos Cascaldi, em 1952, resultou de um concurso privado de Arquitetura.

Situado numa área de 154 mil m2, tem capacidade para abrigar mais de 100 mil torcedores. Que, por meio de rampas, próximas às vias laterais, antes que se falasse em acessibilidade, possibilitam rápido escoamento e mobilidade do público. Em contrapartida, a condição dos sanitários e estacionamentos continua lamentável. A mobilidade urbana? Sem comentários!

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Apesar disso, não podemos nos esquecer que esse “ gigante de concreto armado”, além de sediar jogos marcantes de campeonatos nacionais e paulistas, da Copa América e da Libertadores, foi palco de outros eventos musicais e religiosos.

A exemplo dos inesquecível “sermão do Morumbi”, em 1980, quando o papa João Paulo II, no finalzinho da ditadura militar, em meio ao grito da multidão “João, João, você é o nosso irmão”, erguendo os braços alongados, proclamou: “Trabalhadores, excluídos, vocês São Paulo”!.

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Além disso, foi palco de shows musicais inesquecíveis, como o da irreverente Madonna, do enigmático Michael Jackson, com seu thriller, que revolucionou a linguagem dos clips publicitários. Ou do Guns in´Roses (live & dangerous), do mágico Renato Russo (quatro estações), da Legião Urbana, e do roqueiro Bob Dylan, com seu eterno “for ever young”, além do grupo Metalica (welcome home). O Morumbi, inclusive, foi agendado para abrigar um show dos Beatles, que acabou não acontecendo devido à morte de John Lennon.

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Craques do traço -O projeto Morumbi, em síntese, na opinão dos autores do “Arquitetura moderna pauilistsana”, “veio propiciar aos arquitetos, graças à sua inusitada escala e emprego maciço do concreto armado, a oportunidade de expressarem sua linguagenm (revolucionária e renovadora), até então condicionada a construções de pequeno porte”.

Assim, devemos à competência e traço de muitos arquitetos, a elaboração de estádios e de outros complexos esportivos. Exemplos? O Serra Dourada, em Goiânia. projeto de Paulo Mendes (que já foi considerado o melhor estádio do país), o Fonte Nova, em Salvador, projetado por Diógenes Rebouças, o Pinheirão, em Curitiba, projeto assinado por Joel Ramalho, o Mineirão, em Belo Horizonte, projeto de Eduardo Mendes e Gaspar Garreto ou o Castelão, em Fortaleza, elaborado por uma equipe encabeçada pelo arq. Liberal de Castro.

Jogo aberto - A maquete da reforma do estádio descartada pela Fifa, inclusive, foi objeto de exposição e discussão durante a 8a Bienal de Arquitetura Internacional de São Paulo, em 2009, sob o tema “Ecos urbanos”.

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Súmula – A exemplo das anotações feitas pelo juíz , depois de uma partida de futebol, anotaria:

1) A lamentar: com certeza, os senhores da Fifa desconhecem todo esse background de um passado e de uma história, que não podem ficar de escanteio.

2) A elogiar : a observação do crítico Guilherme Wisnik, ao comentar numa entrevista publicada pelo blog ENTRE, da PUC do Rio: “A copa do Mundo de futebol e as Olímpidas são fatos gigantescamente importantes...(mas) ao que parece as decisões sobre o que será feito com todo o investimento estão acontecendo de maneira não pública, por debaixo dos panos...” Ou seja: sem transparência!

3) A enfatizar: segundo analistas, independente da Copa, o governo deveria investir em outras prioridades de um país com tantas carências sociais e estruturais na área da saúde, da habitação, do meio ambiente etc. *

Apesar disso, Wisnik admite: “é uma chance histórica que está sendo posta nas mãos do Brasil”, que se tornou, aos olhos do mundo, a “bola da vez”

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Resta-nos torcer para que não seja uma bola murcha Enquanto isso, vamos celebrar, conforrne

proclamou Renato Russo, da Legião Urbana,

a nossa ignorância... Já que estamos condenados, conforme a escritora Clarice Lispector, à esperança cada vez distante!

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* José Wolf é jornalista, co-fundador da Revista AU e atual editor do boletim do IAB-SP

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