sexta-feira, 29 de abril de 2011

Arquitetura & realidade

O PÓS - TRAGÉDIA DO REALENGO
Texto: José Wolf
Colaboração: Oliveira Júnior


Passada a especulação midiática da TRAGÉDIA DO REALENGO, no Rio, uma pergunta não quer calar: até que ponto o projeto arquitetônico poderá contribuir para a criação de uma edificação escolar mais segura?

Escola? Projetar uma escola sempre constituiu um programa bem-vindo e cobiçado pelos profissionais de Arquitetura. Apesar de todos os entraves burocráticos institucionais, regimentais etc., desde a criação do MEC- Ministério da Educação e Cultura. A propósito, você sabe o nome do atual ministro da Educação? 

Na condição de editor ou repórter da AU e free-lancer de outras revistas especializadas, registrei vários projetos arquitetônicos escolares exemplares. Entre os quais:
 a escola Bem-me-quer, de Paulo Sophia, cujo terreno e escola acabaram engolidos pela especulação imobiliária, o Colégio  Metropolitano , de Mario Biselli, projeto selecionado num concurso fechado, em 88. além da admirável escola Oswald de Andrade, de Anne Marie Sumner e Luis Espallargas.
E num registro, o  clássico Instituto “Sedes Sapientiae”, de Rino Levi, primeiro edifício escolar paulista destinado à formação superior feminina, com soluções arquitetônicas instigantes, como as grades de pré-fabricados de concreto.

Escola Bem-me-quer (Paulo Sophia)

Colégio Metropolitano (Mario Biselli)

Sedes Sapientiae (Rino Levi)


A eles, acrescentaria o projeto Funad (um espaço pedagógico e sensorial para deficientes visuais), em João Pessoa, de Expedito de Arruda, além do “Projeto Sol”, implantado em Paulínia, no interior paulista, cujo espaço pedagógico desenvolvido pelo arq. Izaak Vaidergorn, propôs a interação entre alunos, professores e a comunidade local. 

Funad (Expedito Arruda)

Conforme adverte Izaak em seu depoimento no livro “Educação não-formal”, numa sociedade que privilegia questões funcionais, burocráticas (e financeiras), as “edificações escolares se parecem mais com hospitais ou prisões, com seus corredores sombrios e espaços fragmentados”. Edifícações escolares que, segundo denuncia o apresentador Datena, são cercados por traficantes de drogas, além de serem alvos, também, de atos de vandalismo, principalmente nas escolas da periferia das grandes cidades.

Aliás, em reportagem transmitida pela TV Globo, vimos várias escolas do país em péssimas condições de funcionamento, com instalações, telhados e paredes precários etc. 

A  partir, enfim, do episódio do Realengo, no Rio, que provocou grande comoção no país, comecei, na condição de repórter, a me indagar: o que a Arquitetura ou os arquitetos têm a ver com isso?
A meu ver, muito!
Mas, qual sua opinião sobre o tema? 

Ao acompanhar o noticiário, percebi, por exemplo, que muitos entrevistados  sugeriram soluções militarizadas, como a instalação nas escolas de detectores de metal, cabine na entrada com policial armado, crachás de identificação dos alunos, catracas  etc., mas ninguém se lembrou da Arquitetura ou dos arquitetos. Que, a meu ver, poderão contribuir com uma resposta mais humanista para a segurança de um edifício escolar.

Vejam: vocês observaram a imagem do prédio da escola divulgada in extremis pela mídia? O que se vê?  Esquadrias (portas e janelas) mal especificadas, com uma fragil entrada de acesso, sem outras opções para uma possível saída de emergência. Além disso, as salas de aula confinadas não ofereciam janelas de ventilação amplas que poderiam ser uma possível rota de fuga para as crianças  ameaçadas. 



Crianças e adolescentes, por sinal,  vítimas cada vez mais por outro tipo de violência escolar: o chamado bullying.

A exemplo de outras demandas, como as guaritas de segurança em edifícios residenciais, a Arquitetura, com certeza, poderá contribuir, para qualificar a segurança dos espaços escolares, com pequenas soluções e propostas arquitetônicas. Entre as quais: acessos de entrada e saída mais amplos, janelas amplas em lugar de vitrôs e telas de proteção, saídas de emergência etc.

Com certeza, concordam  Paulo Sophia e Biselli advertindo: “não podemos  militarizar, porém,  o espaço escolar, um dos espaços mais significativos da inclusão social,  da discussão e do debate mais democráticos de nosso país”. Realista, Biselli lamenta, contudo: ”bem, nós, arquitetos, na verdade, só conseguimos ir até certo ponto”. 

Assim, com certeza, não serão espaços escolares fortificados ou blindados, admitem pedagogos e educadores,  que solucionarão o problema da violência nas escolas de um país, que ainda registra altos índices de analfabetismo ortográfico e gramatical, em plena era digital.


Um exemplo recente de uma boa prática arquitetônica é o projeto do colégio público Gerardo Molina, edificado no bairro de Suba, periferia de Bogotá, na Colômbia. Concebido pelo arquiteto colombiano Giancarlo Mazzanti Sierra, a proposta arrojada qualifica o espaço urbano onde prevalecem moradias autoconstruídas e cria uma "relação amigável que estabelece com a comunidade. Cercas e muros foram completamente abolidos no colégio, executado a partir de um versátil sistema modular".



A mudança do foco do  programa educacional  competitivo passa, sem dúvida, por uma proposta educacional dialógica e solidária de interação e diálogo entre alunos, professores e a comunidade.

Chegou, enfim, a hora, de se repensar o modelo e o tipo de instalação escolar brasileiros! Amanhã, enfim, conforme deseja a música “ Beautiful day”, do U2, poderá ser um belo dia. Se unirmos em prol de uma sociedade mais solidária.

Crianças que perderam suas vidas na tragédia do Realengo:
Luiza Paula da Silveira(14), Karine Chagas de Oliveira(14), Larissa dos Santos Atanázio(13), Rafael Pereira da Silva(14), Samira Pires Ribeiro(13), Mariana Rocha de Souza(12), Ana Carolina Pacheco da Silva(13), Bianca Rocha Tavares(13), Géssica Guedes Pereira(15), Laryssa Silva Martins(13), Milena dos Santos Nascimento(14), Igor Moraes da Silva(13).

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